sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Tirar o quebranto

Tal como seria expectável, o day after após a jornada europeia não afastou as espessas nuvens negras que pairam sobre Alvalade.
Tudo parece acontecer a um Sporting que parece estar, cada dia que passa, mais resignado à sua sorte.
Mais uma vez, o jogo teve todos os condimentos que têm feito os adeptos, aos poucos, afastar-se no apoio à equipa, como ontem se pôde comprovar.
Godinho Lopes também já não poderá agarrar-se aos 35 mil adeptos do jogo com o Estoril, para justificar o que quer que seja.
No entanto, isto não deve deixar ninguém satisfeito ou, pelo menos, não deveria. Os adeptos são parte fundamental na fuga ao desastre completo, mesmo que seja compreensível a frustração que todos partilhamos.
Se por um lado, tal como já referi por diversas vezes, acredito que um dos grandes óbices tem sido o lastimável estado psíquico dos jogadores, não vamos resolver a questão promovendo ainda mais instabilidade. E isto, francamente, não tem nada a ver com projectos, presidentes, candidatos ou qualquer novela de faca e alguidar que queiram arranjar.
O que se passou ontem, uma vez mais, quase nos faz acreditar que podemos estar a lidar contra o sobrenatural ou o flagelo do destino.
Alguém já me pediu a receita para tirar o quebranto, mas desconfio que possa ser um feitiço ainda mais potente.
Mau olhado, não acredito, pois há uns milhões de adversários a desejar-nos o pior, há quase um século, e só resulta pontualmente. 
Lá para o Norte utilizaram estratagemas para afastar os maus espíritos por bem menos, pelo que espero que a breve trecho se recorra a algum afamado bruxo para inverter a tendência.
Quanto ao jogo, depois de uma primeira parte em que os belgas foram superiores, sem no entanto demonstrarem grande arte, pareceu ficar claro que só um acaso nos permitiria marcar um golo, tal o deserto de ideias e a quantidade de opções erradas que cada um dos nossos jogadores tomou.
A segunda parte, contudo, trouxe um Sporting mais desinibido e, essencialmente, com vontade de contrariar a sorte que nos tem voltado as costas.
As bolas divididas começaram, finalmente, a cair nos nossos pés, mas tal não se deveu ao  acaso ou a algum santo milagreiro, mas sim à vontade e determinação demonstradas.
O público pareceu esquecer-se que tinha existido uma primeira parte, e também que já percorremos um terço da época praticamente sem saber o que é vencer, algo inédito no clube.
Contudo, caímos na realidade ao verificar que um sueco nos obrigou a jogar pela 3ª vez, em 4 jogos europeus, em inferioridade númerica. Uma entrada imprudente de Schaars, para quem já tinha amarelo, foi mal ajuizada pelo careca nórdico e pareceu desabar o mundo a nossos pés. No entanto, a garra e  iniciativa de Capel, muitas vezes superior à sua capacidade para fazer uma leitura correcta do jogo, acabaram por inventar o golo leonino.
Por esta altura, os comentadores televisivos do jogo começaram logo a fazer as contas ao grupo, esquecendo-se, porém, que aquela equipa que estava em vantagem se chamava Sporting, a tal que costuma virar as costas à sorte e, por vezes, dá vida a moribundos.
A cavalgada belga contou com muitas facilidades da nossa parte, com muita sofreguidão na hora de defender ou, simplesmente, de ter a bola no pé. Ter 1 jogador a menos não justifica tudo, e as autoestradas em direcção à baliza de Patrício faziam antever que, a qualquer momento, surgiria o tal balde de água fria.
Vercauteren também se juntou à festa, ao operar pelo menos uma substituição incompreensível. Se Capel e Labyad já tinham dado mostras da sua exaustão, a entrada de Ilori mostrou-se arriscada e a de Carrillo suicida.
O jovem defesa acabou por estar associado ao golo, bem como o colega Cédric, impotente para travar as diversas investidas pelo seu lado. No entanto, a equipa não defendeu como um todo, como se pede nestas ocasiões, e esta passa por ser uma falha colectiva.
Também a entrada do peruano pareceu despropositada, numa altura que se exigia alguém que soubesse gerir a posse de bola, provocar faltas e, evidentemente, isto passaria por um jogador mais experiente, como por exemplo Izmailov. Além disso, foi frustrante ver Carrillo entrar com 7 ou 8 minutos de jogo pela frente, e fazer uma recuperação defensiva como se tivesse 110 minutos nas pernas, num qualquer prolongamento. 
Claro está que agora muitos de nós nos agarraremos à calculadora mas, sinceramente, o que nasce torto, tarde ou nunca se endireita, pelo que já somente aponto a mira para o campeonato, com o simples objectivo de tentar minorar os estragos.
Competições europeias. Quem sabe, no próximo ano. 
A não acontecer, seria a primeira vez na nossa longa história, e recorde ímpar em Portugal, e na Europa só  ultrapassado por Real Madrid e Barcelona, os suspeitos do costume.
No entanto, estamos a habituar-nos a bater recordes negativos, pelo que já espero qualquer coisa.
Como não podia deixar de ser, o jogo não ficou marcado só pelo resultado, e pela exibição bipolar.
O dedo em riste de Wolfswinkel veio dividir ainda mais o já dividido universo leonino, mas a mim parece-me haver mais motivos para preocupação que um mero dedo no ar.
Se quiser falar de Ricky, prefiro apontar-lhe o facto de praticamente não ter celebrado o golo, prova de que algo vai mal no seio do grupo ou da cabeça dele. Numa equipa que só marca quase a cada 3 jogos, não celebrar um golo é um sacrilégio.
Ele lá saberá porquê, embora eu desconfie que Ricky também leia o muito que se escreve acerca dele.
Quanto ao gesto alegadamente produzido, recordo que por exemplo Ronaldo já esticou o dedo, em pleno estádio da luz, e não acabou o mundo nem para adeptos encarnados nem para o próprio jogador.
Era contra o adversário mas, o gesto em si, caiu no esquecimento, passadas umas horas.
Perigosa, sim, é a auto-flagelação ou auto-destruição a que os adeptos leoninos se dedicam, por um gesto que, certamente, terá o castigo devido, caso seja provado.
Para finalizar, devo dizer que o que me assusta não é o que já passou. O que me preocupa profundamente é o que aí pode vir. O prolongar desta crise de resultados pode redundar numa psicose colectiva, com efeitos nunca antes vistos para os nossos lados. 
Neste momento, falar  em Liga dos Campeões parece-me despropositado. Será tempo de apontar as agulhas para objectivos muito menos ambiciosos, mas igualmente decisivos para a nossa sobrevivência. Quais? 
A resposta fica no limbo, porque falar disso ainda me pode tornar mais supersticioso.

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